De há muito tempo – mesmo de há muito tempo – que ando a pensar sobre como intervir de uma forma construtiva nos países do terceiro mundo, mais especificamente na esfera educativa, mãe de todas as outras.
Pensamos em África e queremos fazer alguma coisa! À nossa volta, milhentas necessidades. Mas mais do que nas necessidades, focamo-nos nas possibilidades de acção porque não queremos apenas um mundo remediado mas um mundo próspero, um mundo de gente feliz, criativa. Queremos ver um efeito de bola de neve de realização humana e planetária, um Renascimento da profundidade, do longe, do engenho…
Isto dito, certo é que um mooc com um título como “ How to change the world “ teria de ser muito apelativo. Vamos ver o que se faz mundo fora, o que faz quem sabe. Segunda semana, a pobreza. Por entre leituras recomendadas, páginas de fundações e uma Ted Talk, vai crescendo uma qualquer inquietação. Algum desassossego. Uma questão à escolha, entre duas, da semana – a desafiar-me: se fosse responsável pela colocação/ distribuição de vários recursos numa determinada região, quais as três perguntas cuja resposta necessitaria de obter para levar a tarefa a bom porto? De “How to find the Poor” uma ideia interessante – deixar que sejam as pessoas mais necessitadas a auto-sinalizarem-se. Hum… stands to reason…. Uns passos à frente, nova inquietação. Há algo de bizarro, algures, nestas ideias, pressupostos ou exemplos. Começo a dar nomes às coisas: vacinas, redes mosquiteiras, escolarização. Sim, são os nomes das coisas, mas o que há nelas que me deixa indisposta? Bom, a vacinação tem levantado imensas questões, as redes mosquiteiras parecem uma boa ideia, a educação é algo vital… qual o problema, ao certo? O problema é andar a investiga-se como levar as pessoas a vacinar o filhos – dando-lhes por exemplo, um quilo de lentilhas por vacina administrada. Bom… podemos passar além da paranóia? Se calhar é a forma daquelas pessoas receberem algo que até trará alguns benefícios, digo a mim mesma, advogada da voz que não costumo achar valer a pena expressar. Continuemos. Que mais te incomoda? Como levar as crianças à escola e aumentar o número de anos de escolaridade? Bem, por cada 100 euros/ dólares investidos em desparasitação obtemos mais 30 anos de escolaridade. Uau! Hã? Como? Desparasitamos as crianças para conseguir que elas continuem na escola, de uma forma cost effective. Mas… não haverá aqui já muita manipulação? Porque é que temos de usar tais estratagemas para conseguir manter as crianças na escola? Porque as populações são estúpidas e não percebem o valor daquilo que a escola dá. Porque as necessidades básicas se sobrepõem as necessidades de educação. Porque há muitas questões tradicionais ligadas à desvalorização, desencorajamento ou proibição da escolaridade das crianças. Bom, pode ser. Mas também pode ser que a escola não esteja a dar nada que seja percebido como tendo muito valor. Ou talvez não seja assim que a quisessem. OU talvez… bem, esperem lá… que tal perguntar às populações o que é que elas querem?! Ah, bom… é que elas não sabem o que querem. !?? Pois… elas vão pedir armas e coisas assim, não sabem eu afinal uma das formas de medir o desenvolvimento de um país é pela quantidade de fertilizantes utilizada. !??????? Pois, ou vão querer só comida e assim, ou são só medidas que vão parar aos bolsos de alguns porque a corrupção está muito generalizada. Bem, por cá também, mas é possível. No entanto, deixem-me cá repetir a pergunta: Já lhes perguntaram como querem ser ajudados? É que estas pessoas também têm uma visão de futuro, também têm visão. Talvez até já dessem importância à Visão antes do nosso colonialismo europeu. Podem é não querer as mesmas coisas que nós queremos, podem não ter o mesmo tipo de valores. Ou faltar-lhes a informação para escolher, e como a informação selectiva é uma forma de manipulação, aqui temos um problema verdadeiro. Porque não lhes facilitamos a informação? Que sabemos nós, que neste momento atravessamos experiencias que nos questionam tão profundamente, do que é bom para os outros, do que é bom para todos. Ou estas pessoas são de facto inferiores no sentido em que não têm voz nem poder de escolha? Ajudamo-los nos nosso próprios termos e mantemo-los cidadãos de.. terceira. Porque eles não são como nós. É uma espécie de modelo de caridade melhorado, que talvez ensine a plantar e a pescar em vez de dar apenas pão e peixe, desde que as sementes sejam melhoradas e se sigam modelos económicos que nos façam sentido – e em que coloquemos os nossos produtos, a nossa cultura… uma espécie de ninho de cuco civilizacional e financeiro… Deixar pensar, deixar escolher, fomentar o renascimento e a memória do seu percurso cultural… isso seria toda outra dimensão! Sentar esta gente à nossa mesa, ou melhor ainda, sentarmo-nos à sua mesa em fraternidade verdadeira (fra… quantas???) isso não faremos. Porque nós somos aqueles que ajudam os que precisam de ser ajudados e, por isso… nós mandamos! Pois! Afinal é uma ideia radical, “perguntem-lhes!”.
2 de Fevereiro de 2014
Sandra Gonçalves de Gaia